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2.2. Metodologias participativas de diagnóstico

2.2.1. Construindo conhecimento a partir da escuta e do diálogo com o território

 

A elaboração de um diagnóstico socioambiental crítico pressupõe uma postura metodológica coerente com os princípios da Educação Ambiental transformadora: participativa, dialógica, emancipadora e territorializada. Mais do que uma simples coleta de informações técnicas, trata-se de um processo pedagógico e político que envolve os diferentes sujeitos que vivem, trabalham e constroem os territórios – agricultores, estudantes, educadores, profissionais da saúde, servidores públicos, catadores, comerciantes, moradores, lideranças comunitárias.

Nesse sentido, as metodologias participativas são fundamentais para que o diagnóstico não seja apenas um documento técnico, mas um instrumento de escuta, reconhecimento e mobilização social. Elas permitem que a própria comunidade contribua com a produção do conhecimento, interpretando sua realidade com base em vivências, memórias, percepções e experiências compartilhadas.

Como reconhece o PMEA de Charqueada:

“A construção do diagnóstico socioambiental do município contou com fontes documentais, levantamentos técnicos e, principalmente, com a escuta dos sujeitos e a mobilização social, em oficinas, reuniões e conferências públicas” (PMEA, 2025, p. 27).

 

2.2.2. A escuta ativa como base metodológica

 

A escuta ativa é um dos princípios fundamentais das metodologias participativas. Ela valoriza os diferentes saberes presentes no território, reconhecendo que cada pessoa, grupo ou comunidade tem uma forma própria de compreender e vivenciar os problemas e potências locais.

Na Educação Ambiental crítica, essa escuta não se dá de forma passiva ou meramente consultiva. Ela ocorre em diálogo, num processo de construção coletiva do diagnóstico. O educador ou pesquisador atua como mediador, e não como detentor do saber. Como ensina Paulo Freire (1996), “é preciso escutar os saberes dos oprimidos e construir com eles caminhos de superação”.

No contexto de Charqueada, essa escuta ocorreu por meio de:

  • oficinas com educadores, estudantes e técnicos municipais;
  • aplicação de questionários e entrevistas abertas;
  • análise colaborativa de mapas e indicadores;
  • realização de eventos públicos como a 1ª Conferência Municipal de Educação Ambiental;
  • debates em conselhos e fóruns participativos.

Essas estratégias ampliaram a legitimidade do diagnóstico e permitiram incorporar aspectos que os dados estatísticos não captariam sozinhos – como a percepção da poluição em determinadas áreas, o sentimento de insegurança em relação à água, ou o impacto subjetivo da ausência de espaços de lazer nos bairros periféricos.

 

2.2.3. Ferramentas e abordagens participativas

 

Existem diversas ferramentas e estratégias que podem ser utilizadas em processos participativos de diagnóstico, muitas delas empregadas ou sugeridas pelo PMEA de Charqueada. Algumas das mais eficazes incluem:

  • Mapeamento participativo: elaboração coletiva de mapas que representem os problemas e potências do território, como áreas degradadas, fontes de água, pontos de descarte irregular, locais de prática educativa, espaços culturais etc.
  • Linhas do tempo comunitárias: resgate da história socioambiental do território por meio das memórias dos moradores, identificando momentos-chave como enchentes, desmatamentos, criação de parques ou mobilizações populares.
  • Rodas de conversa temáticas: encontros organizados por eixos como saúde ambiental, resíduos sólidos, educação, saneamento, cultura e juventude, promovendo o diálogo entre diferentes grupos sociais.
  • Trilhas ecológicas e visitas de campo: vivência e observação direta do território, com anotações, registros fotográficos, entrevistas e relatos dos participantes.
  • Cartografia social: construção de representações simbólicas e afetivas do espaço vivido, incluindo territórios de exclusão, de conflito ou de resistência.

Essas metodologias permitem articular dimensões objetivas e subjetivas da realidade local. Como aponta Brandão (2002), “ninguém conhece melhor o território do que aqueles que o habitam, constroem e transformam todos os dias”.

 

2.2.4. Participação como processo formativo

 

O envolvimento de diferentes atores sociais no diagnóstico não é apenas um requisito técnico – é um processo formativo em si. Cada oficina, cada escuta, cada visita de campo constitui uma oportunidade de reflexão coletiva sobre o ambiente, a cidadania, os direitos e as responsabilidades compartilhadas.

Em escolas, por exemplo, o uso de metodologias participativas permite transformar o diagnóstico em projeto pedagógico: estudantes podem investigar o entorno, entrevistar moradores, propor melhorias, produzir mapas, vídeos e relatórios. Professores podem trabalhar de forma interdisciplinar temas como água, lixo, biodiversidade, justiça ambiental e mobilidade urbana.

Na perspectiva da Educação Ambiental crítica, o processo importa tanto quanto o resultado. Como destaca o PMEA:

“O diagnóstico foi também um processo educativo, ao envolver sujeitos diversos na análise de sua realidade e na construção de caminhos coletivos para a sustentabilidade” (PMEA, 2025, p. 28).

Além disso, a participação fortalece o pertencimento e o engajamento, criando vínculos entre os indivíduos e os lugares que habitam. Ela estimula a confiança mútua, a corresponsabilidade e a organização comunitária.

 

2.2.5. Limites e possibilidades

 

É importante reconhecer que metodologias participativas exigem tempo, recursos e disponibilidade política. Elas envolvem desafios como:

  • conciliar diferentes agendas e linguagens;
  • mediar conflitos de interesse;
  • garantir diversidade e representatividade;
  • evitar que a participação seja apenas simbólica ou instrumentalizada.

Por isso, devem ser cuidadosamente planejadas e monitoradas, com atenção à escuta de grupos historicamente marginalizados – como populações rurais, juventudes, mulheres, comunidades tradicionais e trabalhadores informais.

Apesar dos limites, as metodologias participativas representam um avanço significativo em relação aos modelos verticalizados e tecnocráticos de planejamento ambiental. Elas tornam visível o que muitas vezes é invisibilizado pelos dados oficiais e conferem legitimidade social às propostas resultantes do diagnóstico.

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