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1.4. Educação Ambiental crítica e a ecocidadania

A Educação Ambiental crítica propõe uma ruptura com as abordagens informativas, normativas ou tecnicistas que dominaram os primeiros programas de Educação Ambiental no Brasil e no mundo. Ela parte do princípio de que a crise ambiental é inseparável das crises sociais, econômicas, éticas e políticas, e que, portanto, a Educação Ambiental deve ser compreendida como uma prática comprometida com a transformação das estruturas de dominação e desigualdade que atravessam a sociedade contemporânea.

Segundo o Plano Municipal de Educação Ambiental de Charqueada (PMEA), essa abordagem “propõe a superação de concepções reducionistas e comportamentais da Educação Ambiental, defendendo a formação de sujeitos históricos, capazes de intervir na realidade e construir alternativas ao modelo de sociedade vigente” (PMEA, 2025, p. 18).

A Educação Ambiental crítica se inspira fortemente na pedagogia freiriana, ao entender o processo educativo como um ato político de leitura e reinterpretação do mundo. Nessa perspectiva, ensinar e aprender são movimentos dialógicos, coletivos e vinculados à experiência concreta dos sujeitos em seus territórios. Como afirma Freire (2015), “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”.

 

1.4.1. A crise ambiental como crise civilizatória

Para os autores da Educação Ambiental crítica, como Leff (2001) e Guimarães (2004), a crise ambiental não pode ser compreendida apenas como uma disfunção ecológica, mas como crise do próprio modelo civilizatório moderno, baseado na exploração da natureza, no consumismo, na desigualdade social e na fragmentação do conhecimento.

Como reforça o PMEA, trata-se de uma crise que “interpela profundamente os modos de vida, as formas de produção e os valores dominantes que orientam a relação entre sociedade e natureza” (PMEA, 2025, p. 19). A Educação Ambiental, nesse sentido, deve servir à construção de novos sentidos para o desenvolvimento, a convivência e a justiça.

Essa visão amplia o papel da escola e das instituições educativas, que deixam de ser apenas lugares de transmissão de conteúdos para se tornarem espaços de reflexão coletiva, escuta ativa e resistência política. A Educação Ambiental crítica convoca educadores e educandos a investigarem o território, a problematizarem os conflitos ambientais locais e a se engajarem em práticas de transformação social e ecológica.

 

1.4.2. Educação como práxis emancipadora

A Educação Ambiental crítica se fundamenta na ideia de práxis — a articulação entre ação e reflexão — como elemento central da formação humana. A educação deixa de ser vista como um processo neutro e passa a ser compreendida como um projeto político-pedagógico comprometido com a emancipação dos sujeitos e com a construção de uma sociedade mais justa.

Nesse horizonte, a prática educativa:

  • valoriza o diálogo de saberes, reconhecendo os conhecimentos ancestrais, populares e científicos;
  • estimula a problematação da realidade, por meio da leitura crítica do território e das contradições socioambientais;
  • fomenta a autonomia e o protagonismo dos educandos, compreendendo-os como agentes históricos e culturais;
  • articula-se com os movimentos sociais e as lutas por direitos, entendendo a escola como um espaço inserido em redes comunitárias de resistência.

Como destaca Loureiro (2011), “a Educação Ambiental crítica tem como horizonte a construção da cidadania ecológica, planetária e solidária, reconhecendo que o projeto de emancipação humana deve estar articulado à preservação da vida em todas as suas formas”.

 

1.4.3. O conceito de ecocidadania

É nesse contexto que surge o conceito de ecocidadania, ou cidadania ecológica, como desdobramento da Educação Ambiental crítica. Trata-se de uma concepção ampliada de cidadania, que incorpora o direito ao meio ambiente equilibrado como dimensão indissociável dos direitos civis, políticos, sociais e culturais.

A ecocidadania pressupõe o reconhecimento do sujeito como pertencente a uma coletividade ambiental, e não apenas nacional ou jurídica. Isso significa assumir responsabilidades não apenas em relação à comunidade humana, mas também em relação aos bens comuns naturais, à biodiversidade, aos territórios e às futuras gerações.

Como sintetiza o PMEA:

“A ecocidadania se concretiza no exercício de práticas coletivas de cuidado, defesa e recriação do ambiente, como bem comum e patrimônio de todos” (PMEA, 2025, p. 19).

O conceito, amplamente difundido por autores como Gutiérrez e Prado (2013), articula três dimensões fundamentais:

  • Cidadania ecológica: consciência dos limites do planeta e compromisso com a sustentabilidade;
  • Cidadania ativa: participação nas decisões públicas, controle social das políticas e engajamento político;
  • Cidadania solidária: construção de vínculos baseados no respeito, na cooperação e na diversidade.

Para ser efetiva, a ecocidadania deve ser praticada no cotidiano das escolas, das comunidades e dos territórios, por meio de projetos pedagógicos que articulem análise crítica, ação coletiva e reconfiguração dos modos de viver.

 

1.4.4. Implicações pedagógicas e políticas

Adotar a Educação Ambiental crítica e a ecocidadania como referência implica uma série de compromissos pedagógicos e políticos. No plano pedagógico, significa planejar ações que:

  • superem a fragmentação do currículo;
  • envolvam os estudantes na construção de projetos coletivos;
  • incluam a análise de conflitos socioambientais reais e próximos;
  • considerem a diversidade cultural e territorial dos sujeitos.

No plano político, implica defender a Educação Ambiental como direito público, garantindo sua presença nos currículos escolares, sua transversalidade nas políticas educacionais e sua articulação com as instâncias de participação democrática.

O PMEA de Charqueada assume essa perspectiva ao propor uma formação voltada ao protagonismo dos sujeitos e à criação de alternativas emancipatórias para o município. Ao final, o plano afirma que a Educação Ambiental deve ser “instrumento de fortalecimento da cidadania, da justiça ambiental e da democracia” (PMEA, 2025, p. 20).

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