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1.3. Correntes teóricas: conservacionista, pragmática e crítica

A Educação Ambiental, como campo de prática e reflexão, é marcada por uma profunda heterogeneidade de concepções, valores e objetivos. Ao longo de sua trajetória histórica, diversas correntes político-pedagógicas foram se consolidando, cada uma com sua compreensão do problema ambiental, do papel da educação e do tipo de sociedade que se pretende construir. No contexto brasileiro, autores como Layrargues e Lima (2014), Guimarães (2004) e Loureiro (2011) têm contribuído significativamente para identificar e sistematizar essas macrotendências, denominando-as como conservacionista, pragmática e crítica.

Segundo Layrargues e Lima (2014), essas correntes expressam projetos de sociedade distintos, que disputam o sentido da Educação Ambiental. Essa disputa não é apenas epistemológica, mas também política, pois se refere aos caminhos possíveis para enfrentar a crise ambiental e às alternativas que se propõem frente à lógica dominante do desenvolvimento econômico.

 

1.3.1. A corrente conservacionista

A Educação Ambiental conservacionista tem suas raízes nas primeiras iniciativas educacionais voltadas à natureza, fortemente influenciadas pelas ciências biológicas e naturais. Seu foco principal está na preservação dos recursos naturais e na valorização da biodiversidade, muitas vezes descolada das dimensões sociais, econômicas e políticas que moldam o ambiente.

Essa abordagem tende a enxergar a crise ambiental como resultado da ignorância ou da falta de consciência individual, propondo, portanto, ações educativas centradas na mudança de comportamento. Assim, campanhas de redução de consumo, separação de resíduos, proteção de animais silvestres e atitudes ecológicas individuais são valorizadas como instrumentos de transformação.

Como aponta o texto do PMEA:

“Essa corrente enfatiza ações pontuais, muitas vezes despolitizadas, como plantio de árvores ou campanhas de limpeza, sem considerar os fatores estruturais que produzem a degradação ambiental” (PMEA, 2025, p. 17).

Do ponto de vista pedagógico, trata-se de uma abordagem informativa e normativa, com forte apelo moralizante, buscando formar indivíduos mais “educados ambientalmente”, mas sem promover uma leitura crítica dos sistemas sociais que sustentam os modelos predatórios de desenvolvimento.

Embora tenha contribuído para ampliar a visibilidade das questões ambientais, a corrente conservacionista é criticada por sua visão tecnicista e a-histórica, que desconsidera as desigualdades sociais, as relações de poder e os conflitos territoriais. Sua limitação reside justamente em tratar o meio ambiente como um objeto isolado da ação humana, promovendo uma educação ambiental “naturalizada”, sem sujeitos históricos.

 

1.3.2. A corrente pragmática

A corrente pragmática, também chamada por alguns autores de “tecnocrática” ou “desenvolvimentista”, surge como resposta à necessidade de integrar as questões ambientais às políticas públicas e à gestão dos recursos naturais, especialmente a partir dos anos 1990, com a consolidação do discurso do desenvolvimento sustentável.

Diferente da corrente conservacionista, que opera no nível comportamental, a abordagem pragmática incorpora elementos da gestão ambiental, do planejamento participativo e da racionalização do uso dos recursos. Está associada, muitas vezes, a programas governamentais, projetos de educação ambiental empresarial e ações institucionais com foco em eficiência, controle e mitigação de impactos.

Segundo Layrargues e Lima (2014), a Educação Ambiental pragmática “busca uma conciliação entre o crescimento econômico e a proteção ambiental, apostando na ideia de que é possível compatibilizar progresso e sustentabilidade”. Nesse sentido, ela assume um viés conciliatório e adaptativo, priorizando soluções técnicas e instrumentos de gestão, como planos ambientais, certificações, compensações e indicadores de desempenho.

O PMEA aponta que:

“Trata-se de uma abordagem que reconhece o problema ambiental, mas evita confrontar as causas estruturais que o originam, atuando na lógica da remediação e não da transformação” (PMEA, 2025, p. 17).

Do ponto de vista pedagógico, a corrente pragmática adota metodologias participativas e contextualizadas, mas frequentemente subordinadas a objetivos gerenciais. A crítica principal a essa corrente reside em sua neutralidade política aparente, que pode mascarar os conflitos sociais e ambientais, promovendo uma falsa sensação de consenso.

Apesar disso, ela é amplamente difundida em projetos institucionais e programas de sustentabilidade escolar, tendo contribuído para a institucionalização da Educação Ambiental em muitos sistemas de ensino.

 

1.3.3. A corrente crítica

A Educação Ambiental crítica, por sua vez, emerge como uma reação às limitações das abordagens anteriores. Fundamentada em uma perspectiva emancipadora e transformadora, ela entende que a crise ambiental está diretamente relacionada à forma como a sociedade se organiza — especialmente no modelo capitalista, que privilegia o lucro e a acumulação em detrimento da vida e da equidade.

Para autores como Guimarães (2004), Loureiro (2011) e Leff (2001), a EA crítica não pode ser apenas um instrumento de gestão, mas um processo formativo profundo, que articula saberes, práticas e sujeitos em torno da justiça socioambiental. Trata-se de uma abordagem que assume a educação como prática política, influenciada pelas pedagogias freirianas e pela ecopedagogia.

O PMEA adota essa perspectiva ao afirmar que:

“A Educação Ambiental crítica reconhece que a questão ambiental está articulada às desigualdades sociais, aos modelos econômicos hegemônicos e às formas de exploração do trabalho e dos bens comuns” (PMEA, 2025, p. 18).

Essa corrente valoriza o diálogo de saberes, a leitura crítica da realidade, a construção coletiva do conhecimento e a participação ativa dos sujeitos. A escola, nesse contexto, deixa de ser apenas transmissora de informações e passa a ser espaço de problematização e reinvenção do mundo.

Além disso, a EA crítica não se limita ao espaço escolar: ela se realiza também nos territórios, nos movimentos sociais, nas lutas comunitárias e nas experiências de resistência. Como afirma Loureiro (2011), a Educação Ambiental crítica deve contribuir para a construção da ecocidadania, compreendida como o exercício ampliado da cidadania que inclui o direito à natureza, à dignidade e ao pertencimento.

A crítica a essa corrente, por parte de seus opositores, é a de que ela seria excessivamente ideologizada ou pouco pragmática. No entanto, como destacam Layrargues e Lima (2014), o compromisso político da EA crítica é justamente o que lhe confere coerência, pois ela se propõe a enfrentar as causas estruturais da crise socioambiental e não apenas seus sintomas.

As três correntes teóricas apresentadas não se excluem mutuamente, e muitas vezes coexistem nas práticas educativas, especialmente em contextos escolares. No entanto, é fundamental reconhecer que elas se orientam por projetos de sociedade distintos, e, portanto, produzem diferentes sentidos para a Educação Ambiental.

O PMEA de Charqueada opta, de forma clara, pela perspectiva crítica, alinhando-se a uma Educação Ambiental que:

  • seja interdisciplinar e dialógica;
  • promova a leitura crítica do território;
  • reconheça e valorize os saberes das comunidades;
  • contribua para a transformação das estruturas injustas e para a construção de sociedades mais sustentáveis e igualitárias.

Como sintetiza o documento:

“A Educação Ambiental que se propõe neste plano é aquela que problematiza a realidade, fomenta o pensamento crítico e engaja os sujeitos na construção de práticas sustentáveis, justas e emancipatórias” (PMEA, 2025, p. 19).

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